terça-feira, 25 de outubro de 2011

Posso Ser

Sei que não posso ser
O que você procura
Mas em meus sonhos mais fundos me torno
Sua luz na noite mais escura.

Lá posso ser seu ar
Seu mar, sua lua, suas estrelas
Lá posso me tornar
A pessoa que mais desejas.

Eu sei que cá estou
Longe de ti
Mas posso sonhar enquanto vivo
Em ti.

Às vezes sonho, inquieto
Com cores e sons e cheiros.
Às vezes penso
Que podia ser mais verdadeiro.

Às vezes quero ser seu ídolo
Seu mais fundo desejo
Mas realmente só sou mais
Um em desespero.

Querida, poderia ser o que quisesse
Mas não me eternece
Ser poeta.

Faço de tudo pra chegar a ti
E vivo a teu lado contanto que viva em mim
Se não souber meu coração
Aí está: é teu.

Garota, às vezes penso que não me conhece
Olha pra mim e não me reconhece
Conversa comigo e não percebe
Que as batidas do meu coração gritam seu nome.


terça-feira, 18 de outubro de 2011

Janela

Enquanto acordo, os raios velhos passam pela janela aberta, esquentando e ressecando minha já tão seca garganta.
As luzes dançam grãos de poeira, num vórtex desenfreado, tão incompreensível quanto o fantasma daquela janela, meio-aberta, meio-fechada, desconhecida em sua pura filosofia.
Eu não sei se o que me incomodava era a janela ou a luz. Luz demais. O velho Sol me acordava com rajadas cada dia mais vorazes, engolindo-me em seu calor, a despeito do meu óbvio cansaço e velhice.
E a janela ventava horas, dias, semanas. Eu, já desistente, rendo à tentação de mudar. Mudar tudo. Trocar de janela não bastaria. Eu ainda lembraria da tristeza da janela anterior e do ócio que me impedia de fechá-la.
Através dela, uma rua malvista, morta, decadente.
Nada pior que o desespero da tentação. A preguiça acalentava meu corpo para que não levantasse, para que ficasse quieto, deitado, e dormisse.
Mas a janela, a rua e o Sol me perturbavam demais. Estava com raiva da Velha Estrela. Acostumei-me com sua presença desde meus tempos pueris, e hoje, quando o demônio da velhice bate à porta, o Sol presente castiga meu velho corpo, com a luz ressecando-me e o calor sufocando-me.
Decididamente, se cedesse ao ócio dormiria, e provavelmente não acordaria. Por isso - e essa foi a decisão mais dura que já tomei -, levantei minha carcaça humana, estalando minhas juntas, e caminhei, lentamente, à janela.
E lá eternizei sua complexa filosofia, fechando-a.

sexta-feira, 7 de outubro de 2011

Sociedade

Como são lindos os olhos burgueses
Que olham para o futuro, em depressão.
Coitados dos rostos vazios dos ricos
Que olham pro nada, sem expressão.

Que se preocupam demais com as coisas.
Que não sorriem.
Que não vivem.

Como são lindos os olhos burgueses!

Pintados, lacrados, importados
Dos países siliconados.

Como são lindas as lentes multicores
Que fazem do pobre mais pobre
   - Mão-de-obra -
E do humano menos humano.

E ainda assim, os olhos vazios dos burgueses,
Têm o poder, a Câmara
E a opressão.

Como são belos os olhos burgueses!

Perfeitos, industrializados, dominados
Pela exaustão.